MEMÓRIAS DO CONTADOR DE
CASOS
Vicente José da Costa e
Maria Cândida de Paiva tiveram e criaram doze filhos. Todos trabalharam em
jornadas pesadas na lida da terra, a cuidar das plantações, do gado e
atividades das entressafras. Desde pequeno, Nelson acompanhou o pai nas frentes
e apreendeu logo os segredos da vida do homem do campo. Porém, ele se sentia
atraído por uma profissão, queria ser militar. Estudou e se preparou para o
concurso. Teve aprovação. Mas seu pai não permitiu que ingressasse na vida
militar. Dizia que essa profissão era para quem não tinha vocação e precisava
ser “adestrado”. Nenhum filho de Vicente José da Costa ingressou nessa carreira,
porque tinha habilidades. Nelson contava esse caso sempre. No início havia um
ponta de tristeza, mas logo se tornou um homem da terra e para a terra,
exatamente como o pai. Casou-se com sua amada Regina e se estabeleceu na Várzea
da Gualter. O que conquistou foi através do cultivo e dos cuidados com tudo da
terra.
Nelson e Regina no lançamento do livro Memória Tropeira, em 19 de janeiro de 2015.
Ouvimos os casos do
Nelson Firmino. Ele investiu na habilidade de narrar. Expunha o tema,
apresentava a introdução, desenvolvia o enredo e logo concluía. De acordo com o
espectador, dosava na entonação. Acompanhava atentamente o receptor. Cada caso
era como se fosse uma redação. Claro, que num contexto de linguagem coloquial. Como
receptor, – aprendi a acompanhar o desenvolvimento de suas narrativas e me colocava
como se fosse um avaliador do ENEM-Exame Nacional do Ensino Médio – ao concluir
a contação, não havia como deixar de dar a nota 10 imaginária.
Para escrever, narrar,
ouvir requer prática e metodologia, como diz a Professora Sônia Queiroz. Nós
precisamos ser mais escutas de nossos idosos, não somente para o aprendizado,
mas principalmente para afinar as relações humanitárias e afetivas. Quando um
idoso conta um caso, precisamos ouvir atentamente, para que ele se sinta
prestigiado e inserido num contexto sociocultural.
Nelson na homenagem ao irmão Nonoca - Festa do Carro de Boi e Tropeiros, 2016.
Nos encontramos em
diversos momentos, alguns de grande alegria e outros de imensurável tristeza. Num
dos mais alegres foi quando recebeu homenagem durante o lançamento do livro Memória
Tropeira – lá estava com sua amada Regina. Outro momento especial foi na
Festa do Carro de Boi e dos Tropeiros – promovida pelas famílias Costa e
Zerlotini, quando prestaram homenagem (in memoriam) ao seu irmão Nonoca e à
Regina. Estampado em seu rosto havia um misto de alegria e de amargor ao mesmo
tempo. Estávamos lá, conversamos sobre as homenagens que eram reconhecimento da
comunidade aos dois personagens significativos de sua vida.
Nelson na homenagem à sua amada Regina - Festa do Carro de Boi e Tropeiros, 2016.
Seguiu a trilha de seu
pai, não só na lida com a terra, mas também na vida de confrade da Conferência
de São Vicente de Paula, onde atuou por quase sete décadas. Com geada, chuva ou
sol, saia da Várzea do Gualter e participava da conferência dominical. No seu
velório, presenciamos a despedida de um confrade, o Sr. Hildo Rosa, companheiro
dos trabalhos dedicados aos menos favorecidos. Nelson foi um homem de fé e de presença
firme em todas celebrações.
Quando Regina adoeceu,
passou a viver com Valéria, que acabou a cuidar dos dois. Nossa gratidão à essa
filha por ter zelado dos pais já na idade avançada e nas adversidades da saúde
abalada pelo tempo. Prima Valéria: – seu bom espírito cristão fez a diferença!
A contação de casos agora
é apenas memória, muitos parabéns para quem parou e pôde ouvir as narrativas
fabulosas construídas por Nelson Firmino, o contador de casos de Tiradentes.
Nelson e Regina, dois queridos! Fizeram parte da minha história...
ResponderExcluirThelma, muito obrigado por sua presença aqui. Esses tios foram muitos queridos por nós familiares e por muitos tiradentinos. Abraço amigo
ExcluirObrigado tio Luiz, texto fabuloso que tocou minha alma, tio Nelson e tia Regina viveram em nossas memórias. Gratidão por compartilhar conosco ❤🙏🥰😘
ResponderExcluirViverão *
ExcluirBruna, muito obrigado por sua presença e comentário aqui. Esse casal partiu e deixou muitas saudades. Naquela vida simples que viveram era cheia de sabedoria e de muitos cuidados de um para com o outro. Abraço
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