30
ANOS DE HISTÓRIA E
25 DE ATIVIDADES
Não, Tempo, não zombarás
de minhas mudanças!
As pirâmides que novamente
construístes
Não
me parecem novas, nem estranhas;
Apenas as mesmas com novas
vestimentas.
William
Shakespeare
Fotografia:
Luiz Cruz.
Sou muito grato a Deus pela oportunidade de
ter vivido em Tiradentes, Ouro Preto, Rio de Janeiro e São Paulo. Nestas
localidades aprendi muito, tive oportunidade de construir aprendizado para a
vida e a estas cidades serei eternamente agradecido. Na década de 1980, quando
morei no Rio de Janeiro, havia uma ebulição cultural carioca, com tantas obras
e inovações a acontecer. Duas delas marcaram profundamente esse período, a obra
de restauração do Paço Imperial e a construção da nova sede da Biblioteca
Municipal Celso Kelly – que atualmente tem outra denominação: Biblioteca Parque
Estadual.
Ao retornar a viver em Tiradentes, por duas
vezes ocupei o cargo de secretário de cultura, turismo e meio ambiente, quando
tive oportunidade para idealizar e executar alguns trabalhos. O primeiro deles
foi a implantação do projeto do paisagista Roberto Burle Marx para o Largo das
Forras, criado em 1980 e inaugurado em 1990. Sua realização só foi possível
graças ao apoio e aporte da Fundação Roberto Marinho, que tinha como
superintendente Joaquim Falcão e na área de patrimônio a arquiteta Silvia
Finguerut. Após a inauguração das obras deste projeto, retomei uma ideia
antiga, a de dotar a cidade com uma edificação para abrigar suas atividades
culturais. Nessa ocasião ainda havia lotes abandonados no centro antigo e na
Rua Direita dois contíguos poderiam sediar tal proposta. Então, fiz os
primeiros estudos para a possível ocupação e construção. Conversei inúmeras
vezes com Yves Alves sobre a ideia. Redigi um projeto e juntamente com o
prefeito Nilzio Barbosa, que o abraçou, fiz sua apresentação em Minas Gerais,
Rio de Janeiro e Brasília. Porém, nada de se obter recursos para torná-lo
realidade.
Numa das reuniões, Joaquim Falcão acabou por
se interessar pela ideia. O apoio do Yves Alves e da arquiteta Silvia Finguerut
foram fundamentais para tal. Porém, transformar um “sonho” em um projeto
executivo, precisava de um arquiteto de peso. Ainda não havia um nome. Então,
lembrei do meu período vivido no Rio de Janeiro e surgiu o nome do arquiteto
Glauco Campello, imediatamente aceito por todos. Não havia outro tão adequado
para pensar numa ocupação no centro antigo de Tiradentes, com sua malha urbana
setecentista praticamente preservada.
Centro Cultural Yves Alves, desenho de Glauco Campello, 1993.
Acervo: Luiz Cruz.
Glauco de Oliveira Campello (1934) nasceu em
Mamanguape-PB, estudou na Escola de Belas Artes do Recife e se graduou pela Faculdade
Nacional de Arquitetura do Rio de Janeiro, em 1959. Construiu uma trajetória
espetacular como professor, arquiteto, restaurador, desenhista, pesquisador e
autor. Tornou-se colaborador de Oscar
Niemeyer para a construção de Brasília e especialmente do Centro de
Planejamento da Unb. Manteve seu escritório de arquitetura no Rio de Janeiro e
criou projetos diversos para o Brasil e para o exterior, alguns deles
premiados. O já referido projeto para a Biblioteca Celso Kelly surgiu após
tratativas com o mineiro Darcy Ribeiro e o projeto do Paço Imperial acabou por
se tornar numa das referências de obra de restauro e boa adequação
arquitetônica no país.
Acervo: Luiz Cruz.
Convite feito, convite aceito.
Agora, nossa narrativa deixa o singular e
segue no plural: – Tivemos a honra de receber o arquiteto Glauco Campello para
apreciar o terreno da Rua Direita e compreender a espacialidade arquitetônica e
urbanística do centro antigo de cidade. Logo, chegaram os estudos preliminares
do que seria o “Centro Comunitário de Atividades Sociais de Tiradentes” – que
veio a ser o Centro Cultural Yves Alves. Conforme o autor registrou:
Estudo
preliminar
A imagem do centro histórico de
Tiradentes é tão harmoniosa e tão afortunadamente preservada que qualquer
intervenção aí tem de ser rigorosamente pensada e medida. Qualquer nova
construção – só excepcionalmente justificável – terá de se submeter ao
vocabulário corrente de sua arquitetura e ao ritmo natural de sua estrutura
urbana. Um desvio formal provoca uma ruptura incômoda como se pode hoje notar
num ou outro ponto, passíveis contudo de serem ainda corrigidos. Esta
observação é válida sobretudo para o caso de construções novas a serem
eventualmente admitidas no preenchimento das falhas existentes no casario de
estilo vernacular, de surpreendente unidade. Isto não significa que a vida
social e urbana da cidade venha a ser congelada e que as novas construções no
centro histórico, ou nas suas imediações, devam copiar ou imitar as
características da arquitetura do século XVIII, na reprodução de “pastiches”.
Cor, materiais, escala, ritmo, proporção
e uma maneira tradicional de construir, são os elementos básicos que dão ao
pequeno conjunto urbano de Tiradentes unidade e concisão relacionadas com o
momento histórico de sua formação e desenvolvimento. Ao lado da preservação
rigorosa de seus monumentos, de suas casas antigas e das características de seu
assentamento urbano, as novas construções e acréscimos – inevitáveis num organismo
vivo como é o tecido urbano das cidades – devem levar em conta, principalmente,
aqueles elementos básicos que identificam a feição peculiar do núcleo urbano.
O projeto para o Centro Comunitário de
Atividades Sociais que a Prefeitura pretende construir em dois lotes contíguos,
situados à Rua Direita, no coração da cidade, envolve essas questões
fundamentais. Desde a construção em local anteriormente ocupado por edificações
das quais se preservaram as fachadas no alinhamento da rua, ao caso da introdução
de um novo volume a ser erguido na parte posterior do terreno.
O programa compreende uma pequena
biblioteca com uma seção especial para arquivo, um auditório com funções
múltiplas (teatro, vídeo, conferências etc.) e áreas livres para as atividades
sociais. [...]
Para facilitar a adoção de um
vocabulário afim com as construções vizinhas optou-se pela localização do
conjunto formado pela plateia, cabine e palco na parte central do bloco,
deixando-se a periferia para os elementos complementares, susceptíveis de um
tratamento arquitetônico compatível com a escala do conjunto urbano. E, de
resto, a solução clássica para esse tipo de programa, já que a plateia e o
palco exigem a adoção de iluminação artificial. Outra questão importante, a da
volumetria da construção, ficou resolvida também com esse arranjo planimétrico.
A plateia de 141 lugares situada, justamente com o palco, sob a parte mais alta
da cobertura de duas águas, permite o aproveitamento do vão sob o telhado, sem
que isso venha se refletir obrigatoriamente no volume aparente da construção.
O pátio central, que funciona como já
vimos, como um anfiteatro ao ar livre tem o caráter de praça interna.
Constituindo, embora, um espaço até certo ponto estranho à tipologia
urbanística de Tiradentes, esta pequena praça interna, destinada a múltiplas
atividades, tem a vantagem de não introduzir um espaço urbanístico novo, à
vista, alterando a fisionomia já consagrada do conjunto setecentista de
Tiradentes. Ela é um espaço recôndito, construído segundo os critérios básicos
comuns ao vocabulário arquitetônico da cidade, mas indicativo, ao mesmo tempo
de sua evolução e dinamismo social.
Rio
de Janeiro, 2 de agosto de 1993
Glauco
Campelo
Glauco
soube, como poucos, olhar e compreender o núcleo remanescente do século XVIII,
tão potente, mas ao mesmo tempo frágil, merecedor de atenção, cuidados para a
idealização e execução de qualquer intervenção arquitetônica. Muito além de ser
um profissional com ampla atuação e reconhecimento, o que mais nos chamou a
atenção foi o cidadão Glauco de Oliveira Campello, como ser humano e sua
capacidade para ouvir tantos discursos sobre as possibilidades, considerar
muito além disso, o espaço, os materiais construtivos, os fazeres, a
implantação na malha urbanística, o meio ambiente, a paisagem. Tudo, tudo
impregnado de histórias, memórias e tantas máculas construídas e destruídas
pelo tempo.
Centro Cultural Yves Alves, desenhos de Glauco Campello, 1993.
Acervo: Luiz Cruz.
Com o
projeto desenvolvido, logo concluído e aprovado, foi necessária a parceria com
a SAT – Sociedade Amigos de Tiradentes que acabou sendo a proponente do projeto
junto ao MinC e foi eleito como tesoureiro José Luiz Alquéres – que acompanhou
detidamente todo processo. Estivemos presentes, na sede da Fundação Roberto
Marinho, no Rio de Janeiro, para a assinatura dos convênios e contratos para a execução
das obras.
O arquiteto
Glauco Campello e Joaquim Falcão – então, superintendente da Fundação Roberto
Marinho, no terreno onde se construiu o CCYA. Fotografia: Luiz Cruz.
O
terreno da Rua Direita, antes da limpeza para se construir o CCYA.
Fotografia: Luiz Cruz.
O
terreno da Rua Direita, antes da limpeza para se construir o CCYA.
Fotografia: Luiz Cruz.
O terreno da
Rua Direita, início da construção do CCYA.
Fotografia:
Luiz Cruz.
A
Collem Construtora, sediada em Belo Horizonte, venceu a licitação e logo deu
início à formação do canteiro de obras e o primeiro a ser contratado para tal
foi o Eliseu Cruz, técnico em contabilidade. Tudo, tudo foi realizado com o
devido acompanhamento da equipe de arquitetos da Fundação Roberto Marinho – na
execução, além de Silvia Finguerut, contou com a atuação da arquiteta Lúcia
Bastos, os engenheiros da Collem, dos técnicos do IPHAN, especialmente da
arquiteta Maria Isabel Câmara e dos membros da SAT. Por recomendação de Yves
Alves, acompanhamos e fotografamos todas as etapas, desde a limpeza do terreno
até a entrega da edificação.
A arquiteta do
IPHAN, Maria Isabel Câmara e os engenheiros da
Collem
Construtora – Alvimar Luis Maria e Cristiano Furtado Borba.
Fotografia:
Luiz Cruz.
Os engenheiros da Collem Construtora – Alvimar Luis Maria, Cristiano Furtado Borba e Geraldo Belloni Perez e a arquiteta Silvia Finguerut, da Fundação Roberto Marinho. Fotografia: Luiz Cruz.
Os engenheiros da Collem Construtora – Alvimar Luis Maria, Cristiano Furtado Borba e Geraldo Belloni Perez e a arquiteta Silvia Finguerut, da Fundação Roberto Marinho.Fotografia: Luiz Cruz.
Com
a obra praticamente pronta, os objetivos e usos do bloco térreo do Centro
Comunitário de Atividades Sociais de Tiradentes foram analisados e ponderados.
Chegou-se à conclusão que a edificação seria integralmente para um centro
cultural, com usos diversos. A Biblioteca Municipal Tomaz Antônio Gonzaga e o
Arquivo Municipal de Tiradentes deveriam ser abrigados em outros espaços. Yves
Alves veio falecer em 1996 e logo surgiu a proposta em homenageá-lo, ao denominar
a edificação como Centro Cultural Yves Alves – CCYA.
Com tudo bastante avançado para concluir as obras,
chegou-se à conclusão de que não seria possível ter carga de energia elétrica
no centro cultural. Coube, então, a intervenção de José Luiz Alquéres junto à CEMIG,
que elaborou projeto, executou obras e possibilitou que o imóvel recebesse tal.
A realização de obras com aberturas no calçamento da Rua Direita é sempre
complexa e requer muitos cuidados e o devido acompanhamento pelo IPHAN. Ainda,
para equipar e poder funcionar, a Fundação Roberto Marinho elaborou outro
projeto para obter os recursos e dotar o CCYA de tudo que fosse necessário para
seu funcionamento adequado.
Após sua inauguração, o CCYA se tornou a
referência das atividades culturais da cidade e da região, a cumprir os seus
objetivos estatutários. Teatro, cinema, concertos, palestras, seminários,
colóquios, encontros, exposições, apresentações etc. vêm ocorrendo em seus
espaços. Ao longo dos 25 anos de funcionamento (interrompidos somente no
período da pandemia da Covid-19), não há como indicar o que mais marcou essa
trajetória dedicada à arte, cultura, educação, lazer e entretenimento. Mas não
há como negar que todos os espetáculos teatrais montados pelo nosso saudoso
Eros Conceição, com a Oficina de Teatro Entre & Vista, sempre aconteceram
com a casa lotada; todas as apresentações que a Sociedade Orquestra e Banda
Ramalho levou ao CCYA teve muita alegria e grande público. Todos os livros dos
nossos projetos foram aí lançados e aconteceram com sucesso. As ações que
envolvem os tiradentinos, com os seus fazeres, habilidades, histórias e
memórias têm público garantido.
Concerto da Sociedade Orquestra e Banda Ramalho. Fotografia: Luiz Cruz.
CCYA edificado, montado e com o mais gracioso
jardim da localidade, Tiradentes passou a sediar os tais “grandes eventos”.
Inicialmente idealizados para lá acontecer, depois de fortalecidos e bastante
divulgados, migraram para outros espaços.
Por certo tempo, a crise financeira afetou
profundamente o CCYA; os conselheiros, por diversas vezes tiveram que
contribuir com seus recursos próprios para a manutenção da casa. Mais uma vez,
coube a José Luiz Alquéres intervir e propor parceria junto à FIEMG/Sesi, através
de seu presidente, Robson Braga Andrade, para assumir a gerência e manutenção
do centro. Enquanto durou, essa parceria foi muito produtiva e possibilitou a
confirmação do CCYA como polo irradiador dos seus propósitos.
Um dos projetos que o CCYA abrigou foi o Grandes
Escritores, idealizado e coordenado pelo nosso saudoso amigo Marcelo
Andrade. Aqui, tivemos oportunidade de receber os mais renomados escritores
brasileiros para conversar, contar suas experiências e ouvir as indagações dos
interessados. Nomes como Inácio de Loyola Brandão, Affonso Romano de Sant’Anna,
Carlos Herculano, Frei Betto, Marina Colasanti e tantos outros passaram pelo
CCYA. Além do encontro com a plateia, todos escritores visitaram o Instituto
Cultural Biblioteca do Ó e o projeto fez doações de livros para as bibliotecas
locais. Em certos encontros, tivemos o prazer de trazer nossos alunos da Escola
Estadual Amélia Passos - EEAP, de Santa Cruz de Minas, para participar e se
encantar com os escritores brasileiros renomados. Em outras oportunidades, para
assistirem peças teatrais, exibição de filmes e palestras; ainda, ocorreram
apresentações exclusivas para os alunos e professores da EEAP.
Projeto “Grandes Escritores”, com Mariana Colasanti e
Marcelo Andrade, no CCYA. Fotografia: Luiz Cruz.
Projeto “Grandes Escritores”, Mariana Colasanti a autografar seu livro, no CCYA.
Fotografia: Luiz Cruz.
Dos inúmeros concertos realizados no CCYA, certos foram
estupendos, como os executados pela Orquestra Sesiminas, os do Festival de Música Antiga Pró-Música, de Juiz e Fora, ou os trazidos pelo
produtor cultural Júlio Varella. Porém, agora, apresentamos aqui um mais
intimista, que tocou profundamente a plateia; do músico, compositor, arranjador
e professor Ian Guest (1940-2022), húngaro que circulou por tantos cantos do mundo
e escolheu Tiradentes para viver, produzir e ensinar. Foi em 2017, com o auditório repleto de
alunos e admiradores do artista que assistimos ao concerto comovente, pela
arte, delicadeza poética e pela história construída por este mestre da música.
Concerto do musicista, professor, arranjador Ian Guest e convidados.
Fotografias: Luiz Cruz.
Encontramos a nós mesmos quando assistimos Dona Doida,
com uma das mais fabulosas atrizes do Brasil – Teuda Bara, espetáculo pessoal
da protagonista, sob a direção de outra atriz, Inês Peixoto. Teuda contracenou
com seu próprio filho, Admar Fernandes, que além de atuar, compôs a trilha
sonora do espetáculo. Dona Doida é uma
daquelas peças idealizadas e realizadas para tocar o coração e a alma de cada
um espectador, para nos lembrar que somos humanos e diversos, por isso
precisamos parar e nos colocar na dimensão do ser e do outro.
Dona Doida foi um
espetáculo de significativa beleza plástica e de grande impacto dramático. E
ainda tivemos oportunidade para participar de bate papo com o elenco e a
direção.
Teuda Bara, em Dona Doida, no CCYA. Espetáculo dirigido por Inês Peixoto. Fotografias: Luiz Cruz.
Nem tudo é sucesso garantido, mas com boa ideia e roteiro
criativo, tudo pode se transformar em bom cinema. Casa lotada, havia uma
espectativa no ar, como será este filme? – Afinal, ele será palatável? Só mesmo
quem esteve no CCYA naquela noite teve noção do sucesso que foi a exibição de Vida
Bandida, filme idealizado, com roteiro e direção de Flavia Frota, Marlo de
Paula e Priscila Natany, a narrar a vida e a história de Marisol (1973-2023) –
personalidade de São João del-Rei. Controversa, polêmica, violenta – que em
situações tenebrosas coloriu os dias de vermelho, com o seu próprio sangue, mas
ao mesmo tempo figura delicada; a “travesti” que foi até rainha de bateria do
aclamado Carnaval local. Marisol viveu em sua casa no Largo da Cruz e apesar de
todos os dramas vivenciados, de tantas ousadias, sempre foi respeitada,
admirada e devota fervorosa de Nossa Senhora das Mercês.
Os diretores e autores do roteiro do filme Vida Bandida e Marisol. Fotografia: Luiz Cruz.
Dorothy Lenner, a atriz e dançarina que nasceu em Bucareste,
Romênia, tornou-se tiradentina de coração. No palco do CCYA, apresentou os seus
trabalhos e deixou plateias maravilhadas com sua arte. Conhecemos o butoh
com esta artista, que ao longo de tantas décadas construiu trajetória ímpar, no
Brasil e no exterior. Aprendemos bastante com Dorothy, com seus gestos, fala,
olhar, sabedoria e arte. Alguns de seus trabalhos trataram das questões
ambientais e existenciais, um dele foi o Percurso das Águas, encenado
com a atriz Lara Dau Vieira.
Espetúculo Percurso das Águas, com Dorothy Lenner e Lara Dau Vieira,
CCYA.
Fotografias: Luiz Cruz.
Ao longo dos anos, o CCYA abrigou inúmeras reuniões de
interesse da comunidade, algumas delas para tratar dos projetos apoiados
finaceiramente pelo BNDES – dentre eles o de Educação Patrimonial, que nos
legou diversas ações e obras publicadas. Ao mesmo tempo em que promoveu
exposições de artistas locais e as mais variadas atividades, como as oficinas
para a confecção de tapetes para a Semana Santa e a de Confecção de Cruzes. Diversas
ações da Educação Patrimonial aconteceram no CCYA, principalmente para os
profissionais da Educação e para alunos, mesmo após o encerramento do apoio do
BNDES.
Por certo período, o CCYA abrigou a Livraria Spix e Martius,
uma iniciativa de Flávia Maggioli (1959-2022), jornalista, livreira e produtora
executiva – com boa experiência na TV. Ao se transferir para Tiradentes,
Maggioli já tinha construída parte de sua trajtória intelectural, permeada pela
literatura, filosofia, arte e gastronomia. Autora da peça teatral Tiradentes
meu amor, encenada no CCYA. A livraria foi um local significativo para o
encontro, o diálogo, o bom café e apreciar excelentes livros e autores. Tempos
bons e que enriqueceram nosso cotidiano e nossa sociabilidade.
Participantes de uma das diversas reuniões realizadas no CCYA para tratar
dos projetos apoiados pelo BNDES. Fotografia: Luiz Cruz.
Espetáculo da Oficina de Teatro Entre & Vista e Companhia de Inventos
para alunos da Rede Municipal de Ensino. Fotografias: acervo Educação
Patrimonial.
Oficina de Confecção de Tapetes, com a professora Patrícia Monteiro, CCYA. Fotografias: Luiz Cruz.
Oficina de Confecção de Cruzes, com a artesã Lilia Fonseca, CCYA. Fotografia: Luiz Cruz.
Professoras da Rede Municipal de Ensino de Tiradentes, CCYA. Fotografia: Luiz Cruz.
Nas ações do CCYA ou nas promovidas pelos eventos, os temas
mais variados foram abordados em seu palco, inclusive o teatro negro e o
racismo. Somente cidadãos que sofreram na pele, nos ossos, no coração e na alma
sabem o que isso pode implicar. Até hoje milhões de cidadãos vivem em situação
econômica desfavorável, mas a arte, a cultura e a educação são os melhores
instrumentos para o fortalecimento e propiciar melhorias da qualidade de vida,
com identidade. Neste sentido, o CCYA foi o proponente junto ao PRONAC do
projeto Recontando o Rosário, proposto e desenvolvido pelo Instituto
Cultural Biblioteca do Ó e que possibilitou a criação do Congado de São
Benedito.
Adilson Siquira, Maurício Tizumba, Maria Carolina Fecina Silva, Sérvulo
Matias e Capitão Prego – encontro do “Tiradentes em Cena”, que tratou do tema:
Teatro Negro – Representatividade e resistência. CCYA. Fotografia: Luiz Cruz.
Memorável foi a cerimônia de entrega de prêmios ocorrida no CCYA, do projeto Contos da Cidade, idealizado pelos professores Luiz Cruz e Anna Karina Bartolomeu, que promoveu oficinas de leitura, interpretação e produção textual – tudo para celebrar os 300 anos de Tiradentes. O projeto contou com ampla parceria e premiou alunos e professores da Escola Estadual Basílio da Gama e das escolas da Rede Municipal de Ensino. Os textos premiados e selecionados foram publicados em caprichada edição, todos participantes se tornaram autores e contribuíram para marcar as comemorações do tricentenário da antiga Vila de São José. E claro, neste dia a boa música executada por jovens talentos da cidade, contribuiu para alegrar ainda mais a cerimônia.
Cerimônia de entrega da premiação aos participantes do projeto Contos
da Cidade – 300 anos de Tiradentes, com a participação de alunos da EEBG e
da Rede Municipal de Ensino. Fotografias: Luiz Cruz.
Apresentação artística dos alunos da EEBG, na cerimônia de entregra
da premiação do projeto Contos da
Cidade – 300 anos de Tiradentes, no CCYA.
Fotografia: Luiz Cruz.
Acervo: Luiz Cruz.
Ao longo dos anos, ocorreram inúmeras apresentações nos
palcos do CCYA, aqui seria impossível listar todas, isso ficará para futuro
projeto de pesquisa acadêmica, que com certeza poderá gerar um belo resultado.
Dentre as mais tocantes apresentações deste espaço cultural, sem dúvida são as
realizadas pelos atendidos pela APAE de Tiradentes. Cada participante da
plateia, após assistir as apresentações artísticas desta instituição de ensino,
jamais será o mesmo, porque elas nos tocam, nos comovem e fazem refletir sobre
a vida e cada um de nós enquanto cidadão e ser humano inserido em ambiente
complexo. Quem ainda não teve este privilégio, programe-se, todo mês de
dezembro o palco do CCYA se transforma no mais belo do Brasil, tudo encenado
com arte, amor e muito encantamento.
Apresentação artística dos atendidos da APAE-Tiradentes, CCYA. Fotografia: Luiz Cruz.
Atualmente, o CCYA é administrado por seu Conselho Deliberativo,
presidido pela sócia fundadora Maria Lídia Montenegro. Duas salas do centro
foram alugadas para gerar recursos para sua manutenção e outra abriga uma
exposição permanente do Sesi Cultura, a manter exposto o acervo litográfico
oriundo da Casa de Gravura Largo do Ó, do Instituto Cultural Biblioteca do Ó e
peças do Museu de Artes e Ofícios, de Belo Horizonte, que é administrado pela
FIEMG. Conta ainda com parceria da Prefeitura e do Sesi. Com recursos escassos,
tem sido um desafio manter o CCYA devidamente preparado para tanta demanda. É
com muita dedicação, carinho e diplomacia que a presidente Maria Lídia
Montenegro tem conseguido tamanha façanha.
Acervo litográfico da Casa de Gravura Largo do Ó,
no Espaço Sesi Cultura – CCYA. Fotografia: Luiz Cruz.
projeto do arquiteto Glauco
Campello, 1993. Acervo: Luiz Cruz.
Lançamento do livro Cordéis da nossa História, construído pelo artista visual Gabriel Leite, numa ação do Artes Vertentes. Apresentação do curso de iniciação musical e Coro Viva Voz. Jardim do CCYA. Fotografias: Luiz Cruz.
E como sempre, quando os tiradentinos são contemplados, com
suas habilidades e talentos, as famílias prestigiam e todos apoiam. Claro,
sempre faz sucesso. E o jardim do CCYA fica até mais bonito. Glauco Campello
acertou com as formas, os materiais, os volumes, as cores, os cheios e os vazios.
Tudo isso só foi possível porque ele é um arquiteto moderno, com vasta
experiência e larga compreensão da cultura arquitetônica recebida através do
trânsito cultural. Tudo que aqui aportou, em termos de edificação, já contava
com ampla aplicabilidade na Europa e em outras partes do mundo, condensada com
subsídios de inúmeras influências e apropriações. Campello soube como poucos
perceber e absorver tantas experiências recebidas, mas apropriadas e
reestruturadas, com sabor e clima de brasilidade. Por isso, Glauco Campello é
um arquiteto moderno e contemporâneo, é também vernacular, e sua experiência em
Tiradentes nos prova isso.
Aqui, não há como deixar de registrar que a Collem
Construtora também executou bom trabalho, seus técnicos entenderam perfeitamente
os propósitos do projeto arquitetônico. As relações transcorreram de forma
muito positiva e à Collem somos gratos pela atenção, companheirismo e sobretudo
a compreensão das propostas. Gratidão aos técnicos e aos pedreiros, serventes,
carpinteiros, serralheiros, pintores, elestricistas, jardineiros e tantos
outros que atuaram nesse campo de obra e nos legou uma construção de boa
qualidade e bonita. Há que deixar
registrados agradecimentos ao Eliseu Cruz e à Regina Carvalho dos Santos pelas
duas décadas de suas vidas dedicadas ao CCYA – a eles, gratidão!
Membros do Conselho Deliberativo da CCYA – Eduardo Leser, Silvia Finguerut,
Glauco Campello e Flavia Frota. Fotografia: Luiz Cruz.
Nos séculos XVIII e XIX, a antiga Vila São José foi contemplada
com harmoniosa malha urbana, onde se instalaram imponentes exemplares da
arquitetura colonial brasileira, como o Chafariz de São José, a Casa de Câmara,
a Cadeia, a Ponte de Pedra, a Capela de Nossa Senhora do Rosário, a Matriz de
Santo Antônio e tantas outras – obras idelizadas e executadas por diversos
mestres artífices, da melhor qualidade, dentre eles o Mestre Aleijadinho
(1737-1814), que “riscou” a fachada da matriz, em 1810 – tudo dentro dos
princípios do decoro e da formosura. Já no século XX a cidade foi agraciada por
trabalhos do paisagista Roberto Burle
Marx e do arquiteto Glauco Campello. Burle Marx criou os projetos paisagísticos
para os largos e cemitérios, através de iniciativa da Fundação Rodrigo Melo
Franco de Andrade e sua presidente, Maria do Carmo Nabuco. Campello criou o
projeto arquitetônico para o Centro Cultural Yves Alves, numa iniciativa da
Prefeitura de Tiradentes e da Fundação Roberto Marinho. Enquanto isso, no
século XXI, a cidade passa por acelerado processo de ocupação desordenada e
forte impacto gerado pela especulação imobiliária, com a implantação de
diversas anomalias urbanísticas, com os condomínios e os loteamentos – a
comprometer o conjunto arquitetônico e urbanístico (tombado desde 1938), a
paisagem, a biodiversidade, a mobilidade, os recursos hídricos e o glamour de
nossa cidade.
Apesar de tudo, o CCYA segue a cumprir sua missão e tomara
que as histórias dos próximos 25 anos sejam tão ricas e calorosas quanto foram
as do seu primeiro quarto de século de existência.
Luiz Antonio da Cruz
Sócio fundador do CCYA
Referências:
CAMPELLO, Glauco de Oliveira. O brilho da simplicade: dois
estudos sobre arquitetura religiosa no
Brasil colonial. Rio de Janeiro:
Casa da Palavra, 2001.
CAMPELLO, Glauco de Oliveira. Cadernos de Arquitetura. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2015.
CAMPELLO, Glauco. Estudos Preliminares – Centro
Comunitário de Atividades Sociais dde Tiradentes. Rio de Janeiro: Edição do
autor, 1993.
CAVALCANTI, Lauro. Moderno e brasileiro: a história de uma
nova linguagem na arquitetura (1930-60). Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Editor, 2006.
CRUZ, Luiz Antonio da. Recortes de Memórias.
Tiradentes: IHGT, 2015.
Comentários
Postar um comentário