MUSEU
CASA PADRE TOLEDO
O
SOLAR DA RUA DO SOL
A
antiga Vila de São José, atual cidade de Tiradentes, é muito privilegiada. Não
tenha dúvida! Surgida com a implantação do Arraial de Santo Antônio, após os
primeiros achados auríferos na região do Rio das Mortes, assentaram o povoado
entre dois elementos geográficos icônicos: a Serra de São José e o Rio das
Mortes. Arraial de Santo Antônio – no alvorecer do século XVIII; Vila de São
José, a partir de 19 de janeiro de 1718; cidade de São José del-Rei, promovida
a 7 de outubro de 1860; a mudança de São José para cidade de Tiradentes ocorreu
através do decreto de 6 de dezembro de 1889, assinado por José Cesário de Faria
Alvim – uma ocupação tricentenária e tudo em decorrência da astúcia dos homens
que almejavam encontrar as jazidas de ouro e de pedras preciosas.
No
entorno da capela pioneira, dedicada a Santo Antônio, surgiram as ruas, os
becos e os largos. A partir da igreja, estendeu-se a Rua do Sol e em meados dos
setecentos edificaram uma imponente casa, a utilizar os materiais encontrados
em seu entorno – moledo, xisto, arenito e recorreram às técnicas vernaculares
da terra – adobe, pau a pique e taipa. Surgiu então, o Solar da Rua do Sol, com
sua monumentalidade e soluções arquitetônicas, com singular modernidade para
aquele período. Posteriormente, a edificação recebeu ornamentação, os tetos
pintados e uma sala com pinturas parietais – atualmente consideradas uma
raridade.
O
Padre Carlos Correia de Toledo e Melo (1731-1803) viveu no Solar da Rua do Sol.
Ele foi o vigário da Paróquia de Santo Antônio e se envolveu com as ideias da
Conjuração Mineira, que pretendia a independência do Brasil de Portugal. Toledo
se tornou no grande mobilizador dos fazendeiros, mineradores e comerciantes da
Comarca do Rio das Mortes, que apoiariam o levante e forneceriam homens,
cavalos e armas. Foi no Solar da Rua do Sol que ocorreu a primeira reunião do
movimento inconfidente, por ocasião da celebração do batizado dos filhos de
Alvarenga Peixoto e Bárbara Heliodora.
Solar da Rua do Sol, atual Museu Casa Padre Toledo. Tiradentes. Fotografia: Luiz Cruz.
O
líder do movimento, o Alferes Tiradentes, foi denunciado e preso no Rio de
Janeiro, no dia 10 de maio de 1789. Padre Toledo recebeu essa notícia através
de bilhete encaminhado por sua amiga, a fazendeira Dona Hipólita Jacinta Teixeira
de Mello (1748-1828). Ele foi preso atrás da Serra de São José e conduzido para
a masmorra da Fortaleza da Ilha das Cobras, no Rio de Janeiro. Após o processo,
sua pena foi o exílio em Portugal, onde ficou preso enclausurado em Lisboa, até
o falecimento, ocorrido em 1803.
Os
bens de Padre Toledo foram listados e confiscados pela Coroa Portuguesa,
conforme registrado nos Autos de Devassa da Inconfidência Mineira.
Ao
passarem por São José, os imperadores do Brasil foram recebidos na Casa Padre
Toledo, para o almoço festivo, Dom Pedro I – em 1822 e Dom Pedro II – em 1881.
Quando
Tiradentes foi comarca, o Juiz de Direito e escritor Edmundo Lins (1863-1944) viveu
nessa edificação – mais tarde, ele foi o 20º Ministro do Supremo Tribunal
Federal do Brasil. Naquele período, juntamente com Wladimir Mata, o
juiz-substituto, lecionaram gratuitamente para os rapazes da cidade: latim,
aritmética, álgebra e geometria. Edmundo Lins recebeu a visita do professor
Carlos de Laet (1847-1927) em 1893. A boa recepção no Solar da Rua do Sol ficou
registrada no livro Em Minas, publicado posteriormente.
O juiz Edmundo Lins, que viveu na Casa Padre Toledo.O Professor Carlos Laet, que visitou o juiz e sua casa. Fotografia de Lins: acervo STF e de Laet: arquivo da família.
No
início do século XX, em 1907, o Major Policarpo Rocha Filho – um dos
beneméritos da cidade, adquiriu a edificação e em 1917 fez sua doação à Câmara
Municipal de Tiradentes. Nessa ocasião o prédio recebeu obra de intervenção de
gosto eclético e passou a abrigar os poderes legislativo, executivo, ainda o
cinema e o teatro da cidade.
Policarpo Rocha Filho, o grande benemérito de Tiradentes, adquiriu a Casa Padre Toledo e a doou para a municipalidade, além de ter contribuído com obras das igrejas da cidade. Fotografia acervo da Orquestra Ramalho; arquivo Luiz Cruz.
Largo do Sol, Igreja de São João Evangelista e Casa Padre Toledo com a intervenção eclética. Fotografia: Ferber, Arquivo Público Mineiro, cópia arquivo Luiz Cruz.
Na
década de 1940, a casa estava em estado crítico de conservação e ocorreu sua
primeira obra de restauração estrutural, executada pelo Sphan e sob a
coordenação direta do seu presidente, Rodrigo Mello Franco de Andrade (1898-1969).
A prefeitura e a câmara permaneceram no imóvel até 1963.
Na
década de 1960, abrigou o Seminário São Tiago, criado pela Diocese de São João
del-Rei. Para funcionar o seminário, ocorreram várias intervenções, inclusive a
construção de uma quadra poliesportiva. O seminário durou período curto, mas
muito marcante. Um dos seminaristas foi Nilzio Barbosa, que morou no antigo
Solar da Rua do Sol. Nilzio se casou, tem filhos e netos – foi vereador e
prefeito de Tiradentes por cinco mandatos. Dona Djanira Malta Silva trabalhou
no seminário, cuidava de tudo, do café da manhã, almoço, lanche, jantar, da
limpeza e das roupas. Ela nos contou que chegava lá muito cedo e só saía depois
que tudo estava em ordem; e afirmou: “trabalhei muito ali, na Casa do Padre
Toledo, cuidando de tudo e dos seminaristas”.
Nilzio Barbosa, empresário e político, foi seminarista e viveu na Casa Padre Toledo, na década de 1960. Foto: Luiz Cruz.
Dona Djanira Malta Silva que trabalhou no Seminário São Tiago, instalado na Casa Padre Toledo. Fotografia: Luiz Cruz.
Em
consequência da necessidade de expansão e o acompanhamento das intervenções sob
controle do Sphan, o Seminário São Tiago acabou transferido da Casa Padre
Toledo. Logo a edificação foi habitada pelas freiras do Colégio Sacré-Coeur de
Marie, onde realizaram muitas atividades junto à comunidade de Tiradentes, uma
delas o “Jardim da Infância”.
Equivocamente,
por certo período, referiam-se à Casa Padre Toledo, como “Casa de Tiradentes”.
O Alferes Tiradentes não teve nenhuma relação com este imóvel.
Seminário São Tiago, Casa Padre Toledo, seminaristas na quadra, década de 1960. Fotografia: Aciphan-RJ, arquivo Luiz Cruz.
No Rio
de Janeiro, em 1970, foi instituída a Fundação Rodrigo Mello Franco de Andrade,
sob a presidência de sua prima, Dona Maria do Carmo de Mello Franco Nabuco (1907-2001).
No dia 24 de janeiro de 1971, a Fundação Rodrigo Mello Franco de Andrade
inaugurou o Museu Padre Toledo, que em determinados momentos fora chamado
também de Museu de Tiradentes. Sua inauguração causou expressiva mobilização da
sociedade cultural mineira e carioca. Para abrilhantar a ocasião, houve uma
apresentação dos musicistas da Orquestra Ramalho. A partir de sua abertura, o
museu teve ampla divulgação na imprensa nacional.
Apresentação dos músicos da Orquestra Ramalho, na inauguração do Museu Padre Toledo. Antônio Nogueira, Adhemar Campos Filho, Didiu (Valdir Fonseca), Luiz França e João Batista Ramalho. 1971. Foto: acervo Fundação Rodrigo Mello Franco de Andrade, arquivo Luiz Cruz.
Jornal do Brasil, edição de 1973, a divulgar Tiradentes e o Museu Padre Toledo. Acervo Aciphan-RJ. Fotografia: Luiz Cruz.
A criação
do Museu Padre Toledo só se tornou realidade graças ao empenho pessoal de Dona
Maria do Carmo de Mello Franco Nabuco, o apoio e a parceria com o Iphan. Na década
de 1980, a edificação recebeu obra de restauração estrutural, que contou com o
apoio da Fundação Roberto Marinho, da Fiat Automóveis, com a execução do
Iepha-MG e acompanhamento do Sphan.
Folder do Museu de Tiradentes – Casa Padre Toledo. Acervo: Luiz Cruz.
A
partir de 1997, a UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais assumiu a administração
da Fundação Rodrigo Mello Franco de Andrade. Após longos estudos e debates sobre
a Casa Padre Toledo – bem cultural a contar com proteção individual pelo Iphan,
desde 1952, inscrita nos livros Belas Artes Volume I e Histórico Volume I, a
equipe técnica da FRMFA elaborou projeto, o submeteu à aprovação e contou com o
apoio financeiro parcial do BNDES. Em 2010, a obra estrutural ficou a cargo da
Construtora Baccarini e o restauro artístico sob a responsabilidade do
Cecor-EBA-UFMG.
Professores, técnicos e especialistas em apresentação dos projetos de intervenção de restauro da Casa Padre Toledo, UFMG, Belo Horizonte. Fotografias: acervo Luiz Cruz.
Durante
toda obra estrutural, os trabalhos foram acompanhados pelo mestre pedreiro e
carpinteiro, da Equipe de Obras do Iphan, José Trindade da Costa, popularmente
conhecido como Zé da Lilina – grande conhecedor da arquitetura vernacular e
suas técnicas construtivas.
O mestre Zé da Lilina e os trabalhadores da Construtora Baccarini. Museu Casa Padre Toledo. Fotografia: Luiz Cruz.
Com certeza esta foi uma das obras com melhor acompanhamento e execução já realizada em Tiradentes. A FRMA e UFMG possibilitaram à comunidade oportunidades para ter acesso às etapas das obras, para grupos de alunos do Ensino Fundamental I e II, Ensino Médio, além de grupos organizados e representantes das instituições locais. As Visitas Guiadas foram relevantes para a comunidade conhecer o processo de intervenção em uma edificação tão singular para os tiradentinos.
Visita Guiada às obras da Casa Padre Toledo, com alunos da Escola Estadual Basílio da Gama. Fotografia: acervo Luiz Cruz.
Visita Guiada às obras da Casa Padre Toledo, com alunos da Escola M. Marília de Dirceu. Foto: Luiz Cruz.
Visita Guiada às obras da Casa Padre Toledo, com grupo de interessados. Fotografia: acervo Luiz Cruz.
Visita Guiada às obras da Casa Padre Toledo, com a equipe técnica e os representantes das instituições culturais da cidade. Fotografia: Luiz Cruz.
A
Casa Padre Toledo no urbanismo e no paisagismo
Ao longo do tempo, a Casa Padre Toledo teve uma dinâmica de ocupação, uso e adaptação; consequentemente o seu entorno urbano direto também, principalmente a rua em que foi implantada – a antiga Rua do Sol, como registrado nos Autos de Devassa da Inconfidência Mineira; em 1824 – seu topônimo aparece como Rua de Cima; em 1890 foi denominada como Rua Vigário Toledo e mantido em 1894; já em 1977, Rua Padre Toledo. A partir dos primeiros anos do século XX, essa rua teve uma dinâmica de trânsito, os automóveis e depois ônibus que circulavam entre São João del-Rei, Barbacena e Rio de Janeiro, tinham-na como rota. A consequência desse uso foi a descaracterização do calçamento pé de moleque, feito com seixos rolados.
Rua Padre
Toledo, com casa no período em que abrigou a Prefeitura e a Câmara e o
calçamento preservado e depois recoberto. Fotografia: Arquivo Público Mineiro e
livro Barroco Brasileiro, acervo Luiz Cruz.
O
ex-governador Juscelino Kubitschek criou a Semana da Inconfidência, com a
abertura oficial em Tiradentes – o acendimento da Pira da Liberdade dentro da
Casa do Padre Toledo e, após a cerimônia, realizava-se o Corrida do Fogo
Simbólico, que chegava a Ouro Preto, para a grande cerimônia e a entrega da
maior condecoração do Estado, a Medalha da Inconfidência Mineira. Desde então,
o Largo do Sol passou a receber mais atenção. Na década de 1960, na
administração do prefeito Francisco Barbosa Junior, foi instalado um monumento
em homenagem ao Alferes Tiradentes.
Obra de construção do monumento em homenagem ao Alferes Tiradentes, como prefeito Francisco Barbosa Junior e o operário da prefeitura, Sr. Benedito. Fotografia: Aciphan-RJ, 1962.
Largo do Sol, com o busto do Alferes Tiradentes. Cartão Postal, acervo Luiz Cruz. Largo do Sol. Fotografia de Marcel Gautherot, Aciphan-RJ, s/d.
Por iniciativa de Dona Maria do Carmo Nabuco e com o apoio financeiro
da Embratur, o artista e paisagista Roberto Burle Marx criou projetos para os
largos de Tiradentes, para os cemitérios da Matriz de Santo Antônio e da Igreja
de Nossa Senhora das Mercês. O Largo do Sol foi então redesenhado por Burle
Marx, com a subtração das árvores casuarinas (Casuarina equisetifolia) e do
canteiro central. A proposta do paisagista foi a da criação de largo amplo para
abrigar a mais importante cerimônia cívica local, a Semana da Inconfidência, e
com as plantas que estariam floridas no período.
Construção do calçamento do Largo do Sol, através do projeto do paisagista Roberto Burle Marx. Fotografia: Luiz Cruz, década de 1980.
A Casa Padre Toledo durante a implantação do projeto paisagístico de Burle Marx, em 1981. Fotografia Aciphan-RJ. Fotografia logo que o projeto foi concluído,Atlas dos Monumentos Históricos e Artísticos do Brasil, acervo: Luiz Cruz.
A Rua Padre Toledo tem expressiva relevância para o tecido urbano da cidade, cada edificação tem sua especifidade, com o seu parcelamento único, os espaços cheios e os vazios em estreito diálogo. Os muros subsistentes, construídos por blocos rochosos – arenito e xisto, blocos de moledo, adobe e taipa – como o do antigo Solar do Comendador Assis, onde atualmente funciona a Escola Municipal Marília de Dirceu, nos permitem contato direto com as técnicas vernaculares da construção. Ou seja, a Casa Padre Toledo e as demais ocupações da Rua Padre Toledo conformam um ambiente urbano e arquitetônico fascinante, um verdadeiro espaço para a compreensão do processo de ocupação e edificação do século XVIII.
Rua Padre Toledo, com muro de adobe, coberto por telhas, década de 1970. Fotografia: Aciphan-RJ e atual, com o muro de pedra calcária, fotografia: Luiz Cruz.
A Rua Padre Toledo foi tema da divulgação da cidade de Tiradentes, numa campanha do Estado de Minas Gerais. Na fotografia, aparece o Sr. Geraldo Rosa, passando com suas mulas. Ele circulava sempre por essa rua, com os seus animais, da sua casa da Rua da Santíssia Trindade e o seu terreno no Carlos Surdo, no sopé da Serra de São José. Diariamente trazia o leite e às vezes lenha em metro para o uso doméstico. Este foi o primeiro poster a divulgar Tiradentes e seu potencial turístico.
A
Casa Padre Toledo e a comunidade
O Solar da Rua do Sol se destaca no cenário arquitetônico da antiga Vila São José e deve figurar dentre as mais relevantes edificações residenciais do século XVIII, em Minas Gerais. A Casa Padre Toledo foi palco de fotos relevantes para a história do Brasil, por ter sido a residência do Vigário Toledo e ali ter ocorrido a primeira reunião dos inconfidentes da Comarca do Rio das Mortes. Aí que os habitantes receberam os imperadores Pedro I e Pedro II para almoço com grande pompa. Foi residência do Juiz de Direito local, Dr. Edmundo Lins. Onde funcionaram a Prefeitura, Câmara, cinema e teatro, mais tarde abrigou o seminário, as freiras do Sacre-Coeur de Marie e por final, o Museu Padre Toledo. Seu interior e exterior sempre fizeram parte da vida da comunidade local.
Casa Padre Toledo no período em que abrigava a Prefeitura e a Câmara. Registro com militares, músicos e jogadores do Aimoré Futebol Clube, dentre eles: Francisco Barbosa Junior, Jovelino Lopes da Cruz, Antônio Nogueira, Joaquim Ramalho Filho e outros. Fotografia: acervo do IHGT, arquivo: Luiz Cruz.
Gerações
consecutivas da família Lopes da Cruz viveram na Rua Padre Toledo. Quando
Joanito Lopes da Cruz se casou com Carminda Ferreira, continuaram a viver na
Rua Padre Toledo. O filho primogênito desse casal, Antonio Faustino da Cruz, ao
se casar com Antonia Augusta da Cruz, passou a viver na casa de esquina do
Largo do Sol com a Rua Padre Toledo. Nessa edificação nasceram os seus três
primeiros filhos, Maria José da Cruz, José Celso da Cruz e Luiza Marilac da
Cruz. Ainda vivem na Rua Padre Toledo descendentes das famílias Veloso e
Ferreira. O advogado Paulo André Rohrmann lá mantém residência desde 1974.
Os irmãos Maria José, José Celso e Luiza, na porta da Casa Padre Toledo. Fotografia: acervo Luiz Cruz.
Nas
solenidades da Semana da Inconfidência, a comunidade participava com muito
orgulho e significativa mobilização. O Largo do Sol ganhava uma dinâmica e
valorização como cenário cívico da cidade e do Estado de Minas Gerais.
Solenidade de Abertura da Semana da Inconfidência, com as senhoras Josefina Nascimento, as professoras Maria José Moura Nascimento, Isis Braga, Regina Paolucci, dona Luiza Pack e a professora Leonor Gomes. Ao fundo as crianças do Jardim da Infância, das freiras, que funcionava nos anexos da Casa Padre Toledo. Fotografia: acervo Luiz Cruz.
A Casa Padre Toledo nas artes
A
edificação que abrigou o Vigário Toledo sempre cativou a atenção dos cronistas,
poetas, pintores, gravadores e fotógrafos. Na década de 1960, partiu de Juiz de
Fora a Caravana Bracher, com a participação dos artistas Décio, Nívea, Carlos e
Lotus Lobo. Eles passaram uma temporada no imóvel ao lado da Casa Padre Toledo
e realizaram muitos registros de Tiradentes, com o casario ainda todo colorido,
com suas formas distintas, os cheios e os vazios. Em 1992, conseguimos reunir
em uma exposição a produção artística da família Bracher e obras de outros
artistas que registram a cidade, na Galeria do Iphan.
Na década de 1970, a pintora Djanira da Motta e Silva (1914-1979) passou duas longas temporadas em Tiradentes, ela trabalhou intensamente. A Casa Padre Toledo foi o tema de algumas obras, uma delas adquirida por José Augusto Cesário Alvim que a presenteou à Dona Maria do Carmo de Mello Franco Nabuco – obra que também esteve na mostra de 1992.
Pintura de Djanira, 1973, óleo sobre tela. Igreja de São João Evangelista e Casa do Padre Toledo. Coleção Particular.
O pintor romeno Emeric Racz Marcier (1916-1990), que se estabeleceu na vizinha Barbacena, sempre circulou por Tiradentes, chegava cedo, armava o seu cavalete e pintava o dia todo. Marcier foi um dos mais expressivos paisagistas que pintou a cidade em diversos ângulos, inclusive com a Casa Padre Toledo. Tantos outros artistas que passaram por Tiradentes, retrataram a majestosa residência do Vigário Toledo.
Emeric Marcier. Paisagem de Tiradentes, com a Casa Padre Toledo. Óleo sobre tela. Coleção Particular.
Pintura de Fani Bracher, Casa de Tiradentes, 1980, óleo sobre tela. Acervo: Martir – Museu de Arte de Tiradentes.
Casa Padre Toledo – Um
museu dedicado à cidade de Tiradentes
Em
1997, a UFMG passou a administrar a Fundação Rodrigo Mello Franco de Andrade.
Atualmente a instituição federal de ensino tem uma Rede de Museus e Espaços de
Ciências e Cultura que é constituída por 25 unidades e uma delas é o Museu Casa
Padre Toledo. Após a última grande obra de restauração estrutural e artística,
realizada entre 2010 e 2012, essa é a terceira expografia de exposição de longa
duração do museu, com o título: Tiradentes Passado Presente.
A
equipe técnica dessa última exposição contou com a participação dos professores
Fabrício Fernandino, Diná Marques, Patrícia Franca-Huchet e a museóloga Lorena
Mello, com amplo apoio da equipe local do Campus Cultural UFMG Tiradentes e da
Pró-Reitoria de Cultura da UFMG. Para o desenvolvimento da atual proposta e sua
execução, o Museu Casa Padre Toledo manteve as portas abertas para a visitação.
Ocorreu, então, longo período de escuta, para que todos que tiveram a
oportunidade de visitar a casa, pudessem se manifestar.
Houve
a preocupação de encontrar a comunidade, prestigiar os valores socioculturais
locais – possibilitar a adequação dos espaços com a história de Tiradentes e suas
camadas de memórias. Nesse sentido, vale ressaltar a dinâmica da cidade, como
palco das ações humanas e sempre em transformação. Agora, o tiradentino se
encontrará nessa nova expografia, que conta objetos de tempos remotos, os
artefatos pétreos recolhidos no Sítio Arqueológico do Cacheu; às cerâmicas de
origem indígena feitas por Zé Paineira e seu filho Tião Paineira, por uma
galeria de fotografias lindas, a nos revelar a beleza de nosso conjunto
arquitetônico e urbanístico, com seus personagens, devoções e celebrações. Os
personagens ilustres da antiga São José também foram contemplados, como o Frei
José Mariano da Conceição Veloso e seu primo Joaquim José da Silva Xavier, o
poeta épico José Basílio da Gama e o próprio inconfidente Carlos Correia de
Toledo e Melo. Rodrigo Mello Franco de Andrade, o primeiro diretor do Sphan, que
dedicou atenção à Casa Padre Toledo, ganhou uma sala especial – além da
homenagem da instituição que recebeu o seu nome: Fundação Rodrigo Mello Franco
de Andrade.
A
cerâmica tradicional de Tiradentes ganhou espaço, valorização e reconhecimento.
Zé Paineira foi casado com Dona Ana, o casal viveu nas Marimbas, num rancho de
pau a pique, coberto de sapé. Havia uma área ampla na frente da casa, onde ele moldava
as peças, colocava para secar ao sol e depois fazia a queima no forno de
barranco. Seu filho, Tião Paineira –
Sebastião Augusto de Freitas (1928-2018), aprendeu o ofício com o avô e
conseguiu manter a tradição ceramista herdada dos seus antepassados indígenas.
O saudoso Tião Paineira continuou com este fazer e técnica, agora realizado por
seus netos Marcos Paineira e Mariana Paineira. A única peça subsistente feita
por Zé Paineira é um pote de guardar água, que pertenceu ao pai de Dona Ninica
– Antônia Maria Jacque, então vizinho de Zé Paineira, agora a integrar a
exposição Tiradentes Passado e Presente.
Dona Ninica e o
pote feito por Zé Paineira. Fotografias: Luiz Cruz.
Os
artefatos recolhidos do Sítio Arqueológico do Cacheu também estão na exposição Tiradentes
Passado Presente, a comprovar a ocupação da região que ficara conhecida
como Rio das Mortes por povos originários, de tempos remotos. Os objetos em
elementos pétreos distintos são preciosidades, a partir deles podemos
compreender melhor a espacialidade da antiga Vila de São José, com a presença
dos indígenas, bandeirantes paulistas, portugueses e milhares de africanos de
tantas nações escravizados, cada grupo pode nos revelar camadas de memórias e
nos contar muitas histórias.
Artefatos pétreos, recolhidos do Sítio Arqueológico do Cacheu. Acervo Museu Casa Padre Toledo, doação e fotografia: Luiz Cruz.
A
equipe da FRMF/UFMG se dedicou com esmero para que cada peça do acervo passasse
por rigorosa ação preventiva e higienização. Tudo realizado com rigor técnico e
segurança. O resultado ficou surpreendente. A cidade ganhou uma linha do tempo,
com todas as datas e informações de interesse cultural – um dos destaques do
painel da linha do tempo é a data 1979 – início do processo de tombamento
federal da Serra de São José.
Tiradentes onde em determinados momentos se aflora o preceito estrutural às manifestações culturais e religiosas de origem afro-brasileira – ao ponto de intervenção do Ministério Público Federal, na nova exposição da Casa Padre Toledo recebeu atenção, espaço, valorização e reconhecimento. Afinal, a cultura brasileira e nossa identidade jamais seria o que é sem considerar a contribuição do povo de origem afro. Sem as mãos, braços e conhecimentos dos escravizados, nosso patrimônio edificado jamais teria a conformação obtida e o mesmo deve ser considerado aos tantos outros segmentos da nossa sociedade: afro-luso-brasileira.
Diná Marques e Fabrício Fernandino remontanto os desenhos de Portinari.
Museu Casa Padre Toledo. Fotografias: Luiz Cruz.
A equipe técnica da nova expografia em momento de escuta com membros da comundade de Tiradentes. Fotografia: arquivo Luiz Cruz.
Linha do tempo. Museu Casa Padre Toledo. Fotografia: Luiz Cruz.
A
inauguração da nova exposição de longa duração do Museu Casa Padre Toledo
ocorreu no dia 18 de julho de 2025, contou com a presença da Reitora da UFMG:
Sandra Regina Goulart de Almeida, do Pró-Reitor de Cultura: Fernando
Mencarelli, da Diretora do Campus Cultural UFMG Tiradentes: Patrícia
Franca-Huchet, do Presidente da Fundação Rodrigo Mello Franco de Andrade: Pedro
Vasconcelos Maia do Amaral, Pedro Nabuco – neto de Dona Maria do Carmo de Mello
Franco Nabuco, representante da sua família, do prefeito José Antônio do
Nascimento e convidados. Houve uma mesa, com a participação dos curadores e
apresentação do Mestre Prego, do Congado de Nossa Senhora do Rosário e Escrava
Anastácia, que com sua bandeira, conduziu os presentes para a visita à nova
exposição.
Cerimônia de inauguração da nova exposição de longa duração Tiradentes Passado Presente e a mesa dos curadores. Museu Casa Padre Toledo. Fotografias: Thais Andressa.
Mesa de abertura da cerimônia de inauguração da nova exposição de longa duração Tiradentes Passado Presente. Museu Casa Padre Toledo. Fotos Luiz Cruz.
Mestre Prego na cerimônia de inauguração da nova exposição de longa duração Tiradentes Passado Presente. Museu Casa Padre Toledo. Fotografia: Luiz Cruz.
Agora,
é chegar e visitar. Agora, é chegar e se encontrar com a nossa amada cidade,
nessa edificação tão fabulosa. Aproveite, programe-se! Venha visitar Tiradentes
e o Museu Casa Padre Toledo. Aqui a arte e a cultura são expressivas, programe
um dia só para visitar os nossos museus – ainda temos o de Museu de Sant’Ana, o
Museu da Liturgia e o Martir – Museu de Arte de Tiradentes, além do Centro
Cultural Yves Alves, o Instituto Mário Mendonça Arte e o Instituto Rouanet.
Luiz Antonio da Cruz
Doutor e
mestre em Arquitetura e Urbanismo pela UFMG,
prestou estágio pós-doutoral em História, pela
Fafich-UFMG
Parabéns pelo lindo trabalho de pesquisa ! Aprendi muito e revi algumas ideias que fazia desta casa. Infelizmente não pude estar presente à inauguração, mas vou visitar a exposição. Foi um belo trabalho de resgate da nossa história.
ResponderExcluirMuito obrigado pela presença aqui e pelo retorno. A Casa Padre Toledo é um espetáculo de edificação. Agora, com a nova exposição "Tiradentes Passado Presente" precisa ser visita e revisitada. Essa casa tem muitas camadas de memórias. Abraço
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